"MÃE, mesmo em maiúsculas, palavra tão pequena para um significado tão grande. És a pessoa mais corajosa que eu conheço! Ultrapassaste e ultrapassas um monte de obstáculos, tudo sozinha, nunca deixando de ser a melhor mãe que alguém poderia ter.
A vida não tem sido a melhor para ti, no entanto, é raro o dia em que demonstras algum tipo de fraqueza ou tristeza.
És forte, determinada, optimista, esforçada, inteligente, trabalhadora, culta, protectora e tens um coração que vai daqui até à lua!
Gostava muito de poder tirar de ti tudo o que te provoca sofrimento, preferia mil vezes que fosse eu a passar por isso e peço desculpa se, muitas vezes, não sou a filha que mereces.
Só queria poder tornar-te eterna!
Sempre cuidaste de mim e, quando precisares, vou cuidar de ti.
És a minha Nº1, a minha heroína. E eu nunca vou deixar-te sozinha.
AMO-TE, MELHOR MÃE DO UNIVERSO!"
Beatriz
(carta escrita à mão, em papel, sem tecnologias envolvidas, entregue no Dia da Mãe)
É desnecessário dizer o quanto me encheu o coração ler esta carta que juntei a muitas que os meus filhos me foram escrevendo pela vida fora.
No entanto, não consegui deixar de reparar que o amor deles por mim (e o meu por eles) floresce a cada dia que passamos juntos e assim tem sido ao longo destes 20 e 23 anos das suas vidas. Curiosamente, em nenhuma destas cartas foi referido o tempo da gestação ou do parto, pois essa é uma memória que eles não têm.
E vem-me à ideia a história que eu lhes contava sobre o seu nascimento (até muito tarde, diga-se de passagem)... nessa história, eu e o pai deles íamos ao céu falar com Deus para escolher os nossos filhos. O anjo Gabriel aparecia com um grosso livro cheio de fotografias de bebés e nós escolhemos o Tiago primeiro e a Beatriz depois mas deixei sempre claro que eram ambos edições limitadas e exclusivas, escolhidas depois de aturada reflexão e demais deliciosos pormenores que se foram esbatendo no tempo.
E se assim fosse, tê-los-ia amado menos?
Claro que não, o amor chega depois, todos os dias da nossa vida.
E, rapidamente, foge-me o pensamento para um dos temas da agenda do nosso executivo governamental, a legislação/ legalização das "barrigas de aluguer".
Eu sei que fui abençoada com um sistema reprodutor saudável que me permitiu levar duas gravidezes a termo com os respectivos partos por via natural.
Também sei que a gravidez é uma fase da nossa vida em que tudo acontece literalmente à volta do nosso umbigo, por dentro e por fora... é inesquecível a primeira vez que ouvimos o coração do nosso bebé a bater... é inesquecível a primeira vez que sentimos os seus movimentos dentro do nosso ventre.
É, inegavelmente, um período sagrado durante o qual o nosso corpo se transforma num templo de amor e de expectativas.
Um verdadeiro milagre apenas concedido às mulheres, actualmente, com maior ou menor intervenção masculina.
Cedo ou tarde, a maioria das mulheres escuta com atenção o bater do seu relógio biológico e a maternidade torna-se um sonho recorrente a tornar realidade tão cedo quanto possível.
Para algumas de nós, contudo, tal realidade rapidamente se transforma em pesadelo, sendo inevitável a aceitação ou rejeição da ideia de que não poderemos concretizar esse sonho com base nas mais variadas explicações clínicas. Chegadas a este ponto e exploradas todas as técnicas de fertilização já ao dispor, resta a resignação ou a adopção.
E é precisamente aqui que surge a questão de alugar uma barriga para transportar o óvulo da futura mãe fertilizado com o espermatozóide do futuro pai durante os mágicos 9 meses mas, por favor, não tenhamos ilusões... é realmente maravilhosa a gravidez quando esta acontece no nosso próprio ventre... as alterações hormonais, o crescimento do peito, o aumento gradual da barriga, o sono, os desejos, os enjôos, só fazem sentido se os sentirmos.
Na minha cabeça, esta ideia faz tanto sentido como pedir à minha irmã para comer uma barra de chocolate por mim porque eu sou alérgica!?!
Concebo que cada mulher seja livre para fazer o que desejar com o seu próprio corpo mas sem perder de vista a ideia de que essa liberdade tem como limite a identidade dos nossos filhos. Será que é mesmo necessário lembrar que, após um compromisso assumido com a maternidade/ paternidade, não nos é permitido tratar os nossos filhos doutra forma que não seja com o respeito que devemos a qualquer outro ser humano? São nossos filhos, não são o nosso prolongamento! E nada como a sábia definição de Saramago do que é um filho:
“Filho é um ser que nos foi emprestado para um curso intensivo de como amar alguém além de nós mesmos, de como mudar nossos piores defeitos para darmos os melhores exemplos e de aprendermos a ter coragem. Isso mesmo! Ser pai ou mãe é o maior ato de coragem que alguém pode ter, porque é expor-se a todo o tipo de dor, principalmente o da incerteza de agir correctamente e do medo de perder algo tão amado. Perder? Como? Não é nosso, recordam-se? Foi apenas um empréstimo.”
José Saramago
Independentemente de todas as questões morais associadas a este tema e que são muitas, o facto de qualquer mulher poder alegar "afecto" mas receber, indevida e ilegalmente, contrapartidas financeiras para o fazer (dando origem a mais uma economia de mercado paralelo) vai transformar a maternidade num produto cuja aquisição dependerá do estatuto económico ou do poder de compra/ aluguer de cada um, quiçá, com direito a benefícios fiscais. Por outro lado, estando o nosso país a enfrentar uma situação de grave carência económica (a necessidade aguça o "mau" engenho de cada um), não duvido nem por um segundo, que rapidamente se transformaria a maternidade num florescente nicho de mercado, com lojas e sucursais oferecendo barrigas escolhidas a dedo, com direito a promoções, saldos e cupões de desconto!
Perdoem-me a ironia mas é tão fácil prever uma situação destas. Afinal, não andam os valores morais pelas ruas da amargura?
Voltando à Beatriz, apraz-me dizer que poderiam apresentar-me todas as provas inequívocas de que os meus filhos teriam sido fruto de um erro hospitalar, tendo sido trocados à nascença, que eu jamais trocaria um segundo destes anos passados com eles, por um filho biológico. Pasmem mas a gravidez representa uma parte ínfima no processo de maternidade!
Ser mãe é muito mais, ser mãe é criar, guiar, cuidar, estimar, consolar, educar, transmitindo-lhes os nossos melhores valores, recebendo deles as provas inequívocas do seu amor.
Parir é biológico, é animal e qualquer uma, boa ou má mãe, consegue fazê-lo, infelizmente, em certos casos. Para se ser mãe é que é preciso ter muita competência. E, se tiver competência de mãe, vai saber amar qualquer criança que entre na sua vida com o nome de "Filho". Se tiver competência de mãe, não vai querer que o seu bebé seja gerado por empréstimo numa estranha e confusa relação a três.
São tempos de grandes mudanças, franca evolução e devemos manter-nos abertos às novidades mas eu aposto na razoabilidade e no bom senso. Eu aposto no velho amor incondicional!
Muito bem!!! Bonito texto, mas barrigas de aluguer???? Em que é que ficamos... prostituímos os géneses?
ResponderEliminarEu acho que não, sou a favor do bom senso e o meu diz-me que, para amar um filho, só precisamos de um coração saudável!
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