Houvesse tal opção no Facebook e eu alegremente publicaria que estou "numa relação comigo mesma". Ao contrário do que possam pensar, este amor sempre foi por mim contrariado, cheio de altos e baixos, infelizmente, mais baixos do que altos.
Tenho-me acompanhado e sei que mal dou por mim, não me dando grande importância. Tudo o que digo ou faço afigura-se-me insuficiente ou medíocre, criando em mim grandes tormentas internas. No entanto, tenho procurado mais a minha companhia e tento conhecer-me o melhor possível, até porque desejo encontrar desesperadamente uma explicação para tudo aquilo que me destruiu ou não, principalmente, as escolhas, na sua maioria, más.
A partir de uma certa data, ainda por determinar, chamei para mim a responsabilidade de fazer os outros felizes, a responsabilidade de proteger, de amar incondicionalmente, de espalhar sem grandes critérios a minha enorme generosidade, esquecendo o mais importante de tudo e que, para mim, nunca passou de um chavão, cliché ou parte de um já muito ouvido discurso motivacional que é o facto de "nunca colocarmos na mão de terceiros a nossa felicidade".
Posto isto, acabei por me casar, divorciar-me, assumir uma união de facto, separar-me e casar-me outra vez (desta, era para sempre), estando a aguardar o divórcio depois de uma catástrofe emocional avassaladora.
Mas, há sempre um mas na vida, aquilo que parecia o fim, afinal transformou-se em recomeço. E como? - perguntam-me agora.
Imagine-se o seu pior inimigo...

Imagine-se tão inimigo que os seus ombros desaprendem a descontrair...
Imagine-se com ataques de pânico e ansiedade paralisantes...
Imagine-se em constante luta pelo controle da sua vida e dos que ama...
Imagine-se atingir os 50 anos e não ter a mais pequena ideia de como lidar consigo próprio, com as suas desconhecidas e recentes fragilidades, com uma cruel sensação de impotência...
Isto foi o que fiz a mim própria, anos a fio, com um sorriso bem afivelado na cara, a mesma máscara para todo o sofrimento, a utilizar a meu bel-prazer e nas mais variadas ocasiões...
Telemóvel transformado em prolongamento do braço e da alma, não fosse "o menino ter outra crise de epilepsia", ao longo de 23 anos, numa média de 1 ou 2 por semana, alerta silencioso e constante, dia e noite, ano após ano.
E a mamã e a irmã e o irmão (para sempre perdido para o álcool) e o pai e a família e os amigos e os amantes e os namorados. Quem julguei eu que era? Que soberba foi esta de achar que teria que representar Deus? De achar que o mundo iria ruir no dia em que eu não me apresentasse ao "trabalho" de me dar a quem me rodeava?

De repente, começo a falhar, física e psicologicamente, o corpo dá sinais inequívocos de exaustão, transformada em doença auto-imune que mais não é do que o organismo a iniciar um ataque, mais ou menos, brutal contra si mesmo. E não foi isso que eu fiz sempre? A única diferença é a inversão da agressão: dantes agredia-me de fora para dentro executando ordens minhas, agora, é de dentro para fora e sem a minha intervenção.

Gostar de mim é a palavra-chave, aceitar-me, aceitar o que fiz e o que deixei fazer... abraçar o meu passado para viver em paz o presente e ganhar esperança no futuro. A fórmula parece simples, assim eu consiga pô-la em prática.
Fundamental neste processo, foi esta derradeira estocada do homem que pensei meu marido. A estupefacção, a decepção e o choque, fizeram com que se tornasse muito agradável este contacto comigo própria e entendo ser uma relação para manter a longo termo.
Sou uma pessoa agradável, bem educada, com formação, inteligente, simpática e charmosa (isto obedece a mentalização para me habituar a ser cortês comigo própria - não é presunção, juro!)
O aspecto exterior ainda mantém algum encanto, com a vantagem de aceitar incondicionalmente o passar dos anos e, por isso, julgo estarem reunidas as condições para dar início a esta relação comigo própria!

E, como não poderia faltar um dos meus comentários jocosos, imagino que estejam a perguntar-se:
"Está tudo muito bem, um discurso muito bem elaborado, cheio de boas intenções mas o sexo, que é bom, como é?"
E eu respondo de forma brilhante e iluminada, dando origem a um sentido adágio popular:
Mais vale um amigo a pilhas do que um inimigo a pila! (pardon my french)
Bem escrito , claro e se me permite , com tal clarividência de espirito não acho que viva nas " tormentas " um abraço e bem-haja pela partilha ...
ResponderEliminarMuito obrigada, Luís. A minha clarividência sempre me permitiu encarar a vida com optimismo, malgré tout. Por isso, sim, sinto-me bem a maioria das vezes e tudo o que vivi e ainda virei a viver, fez e faz de mim quem sou, é a minha história escrita e por escrever. Bem-haja pelas suas palavras. Abraço
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