terça-feira, 29 de dezembro de 2015

A LEI DO PIROPO OU SOU EU QUE ESTOU DOIDA?

Uma nova lei surgiu no horizonte do sistema judicial português.
Congratulo-me, verdadeiramente, por saber que a nossa Justiça funciona na perfeição e, na ausência de atrasos de monta nos tribunais portugueses, lá arranjamos uma lei para proteger as desvalidas e frágeis mulheres dos infames piropos, elevando ao infinito o número de casos a ser arbitrados, julgados e penalizados, uma vez que o assédio sexual já se encontra devidamente legislado.

Fico muito feliz, ainda, por saber que as nossas prisões dispõem de espaço e condições para receber um sem número de energúmenos que vivem na criminalidade visual, dirigindo perigosos e agressivos piropos, sendo certo que, a exemplo dos outros reclusos, sairão devidamente reabilitados e não mais levantarão os olhos na rua, sob pena de serem injustamente acusados de "piropédio" sexual.

Vocês devem estar a gozar-me... só pode!

Todos os dias, todos os dias sem excepção, surgem notícias de agressões e homicídios perpretados contra mulheres, maioritariamente, pelos maridos, namorados ou familiares. Quase todos os dias, lidamos com crimes hediondos contra crianças e jovens. A nossa Justiça revela-se impotente para resolver estes casos com a celeridade necessária e com a mão pesada que tais crimes merecem.

Se quiserem alterar leis, porque não alterar a lei que permite que o marido agressor permaneça na casa da vítima, simplesmente porque paga as despesas?

Alguém pode explicar-me porque é que a nossa legislação fez com que, a determinada altura da minha vida, eu fosse obrigada a fazer uma mala para mim e para os dois filhos, com dois agentes de autoridade junto a mim, enquanto eu colocava soutiens e cuecas dentro de uma única mala e que, por mote próprio, me aconselharam a fugir da minha própria casa para um local seguro porque o agressor/cônjuge tinha direitos sobre a casa (iguais aos meus, por acaso) e não havendo flagrante delito, eles teriam que ir embora.
Onde é que estava o Estado de Direito quando eu tive que desaparecer e o agressor ficou na casa de morada de família?
Onde é que estava o Estado de Direito quando eu fui agredida?
Eu tive uma fuga privilegiada porque podia, eu tive apoio psicológico porque procurei mas e as outras mulheres? Têm mesmo a protecção policial? Têm o mesmo suporte familiar? Não devia o Estado intervir e proteger as cidadãs e os seus filhos?

E porque não aumentar as penas em casos de violência doméstica? Porque não estabelecer a prisão preventiva como medida de coacção única? Porque não obrigar ao afastamento total ou prisão efectiva de todos estes cobardes criminosos em vez de criar abrigos para mulheres vítimas de violência? Somos vítimas e nós é que temos que fugir? Nós é que temos que alterar a rotina dos nossos filhos? Quantas vezes é vítima uma mulher ao longo deste processo?

Devo deduzir que estas mentes legisladoras iluminadas que querem emperrar ainda mais o nosso já lento sistema judicial, consideram legítimo o insulto no seio familiar mas ofensivo o piropo dirigido por um estranho!!!


Ao longo da minha vida, fui alvo de um sem número de piropos e até assédio. Em qualquer das situações, soube comportar-me à altura (a indiferença costuma resultar) e nunca pensei sequer chamar a polícia de cada vez que houvia algo como: "És boa como o milho!" (nunca soube o que o milho tem que ver com isto) ou: "Queres... ou Fazia-te...".
Que raio de mulher seria eu e como me sentiria insultada se tivesse que ter um agente da autoridade a defender-me de uma ridicularia destas. Isto sim, é que denigre a imagem das mulheres, dando-as como seres ineptos e inferiores, incapazes de se defender ou responder à letra quando se sentem incomodadas.

Se ouvi muitos e muitos piropos, foi porque era merecedora de cada um deles! Não mereci foi ser agredida, isso não. Onde estavam as senhoras e senhores legisladores enquanto isso acontecia?

Quero violadores, pedófilos e agressores a apodrecer nas cadeias. Entretenham-se a alterar as medidas de coacção, a duração das penas e uma efectiva aposta na reabilitação do recluso... A legislação actual carece de revisão urgente!




Mas o piropo? Tenham Santa Paciência, isto só pode ser uma anedota de manifesto mau gosto!


Cristina dixit!







segunda-feira, 28 de dezembro de 2015

O SEGREDO (DE BEM VIVER)

Nestes últimos tempos, tenho estado sujeita a algumas provações que interferiram directamente com a minha inspiração e humilde habilidade literária, privando, assim, o mundo inteiro da enriquecedora verborreia com que o brindo, de tempos a tempos.
Passo a traduzir, não vos chateio há algum tempo com os meus pensamentos porque tenho andado com uma dores do catano (caberia aqui o vernáculo tripeiro na perfeição!).

Hoje, no entanto, talvez ainda inebriada pelos inspiradores sentimentos que esta época nos suscita, resolvi trazer à luz do dia um tema muito sério: o segredo de bem viver a vida que temos e não a vida que sonhamos...
Acompanhada pelo Adágio de Albinoni, tudo me parece certo e sorrio diante de pequenos milagres que todos os dias nos acontecem e continuamente ignoramos, os pequenos grandes nadas do nosso dia a dia.

Recordo as palavras que dirigi ao meu psiquiatra na última consulta, na tentativa vã de o iludir, invertendo ingenuamente os papéis: "Vai correr tudo bem, eu consigo, eu vou conseguir!". Como sempre, ele esboçou um enigmático sorriso e nada disse.

E aqui estou eu, ora cheia de drogas, ora cheia de dores, tentando encontrar um sentido para a minha vida. Abalada pela abrupta deserção do meu marido, num estado de derrapagem financeira iminente, sentindo-me impotente dentro do meu corpo já tão massacrado, com o pensamento na doença do meu filho que teima em não o abandonar, preocupada com o futuro da minha filha, temendo transmitir-lhe as minhas apreensões, dando espaço à minha mãe, tão abandonada por mim, levando ao colo as suas maleitas, o Alzheimer do marido, o alcoolismo do filho, as preocupações das filhas e dos netos e sempre, sempre  junto da minha irmã, reunindo histórias sem fim que fariam chorar as pedras da calçada mais antiga...

E procuro um sentido para tudo isto, sendo que o mais simples, mais fácil e mais utilizado (talvez porque o visado não pode defender-se) é o comum: "Porquê eu, Meu Deus? Porquê eu? Que mais tens Tu reservado para mim? Que mal Te fiz eu?"

Ora, Deus tem mais que fazer do que inventar desgraças e maleitas para atribuir a cada um de nós, qual Crime e Castigo de Dostoievski. No limite, Deus fez o favor de nos criar dotando-nos de livre arbítrio para podermos fazer as nossas escolhas ao longo da vida. Dotou-nos ainda de resistência e resiliência para podermos suportar os imprevistos e os resultados das más escolhas. Dotou-nos de força de vontade para ultrapassarmos as dificuldades. Deus, para quem acredita nesta versão, deu-nos muito mais do que nós conseguiremos compreender ao longo da nossa vida.


A culpa é nossa se não sabemos apreciar a vida, tal e qual ela é...
Se o meu marido foi, agora, cruel e injusto, antes disso, proporcionou-me momentos de enorme felicidade e prazer. Porque não valorizar esse período?
Se agora estou doente, já estive saudável e vivi plenamente todos os bons momentos que surgiram. Porque não focar-me nesse tempo?
Apesar da doença do meu filho, pude viver bem perto dele e vi-o feliz tantas vezes que nem me lembro. É aí que a minha memória deve residir.
Apesar de todos os pesares, os meus filhos estão ao meu lado e devolvem-me todos os dias todo o amor que lhes dediquei. Não é isto mais importante do que tudo?
Tenho amigos a quem não dou a devida atenção apesar de, numa dada época, ter passado momentos muito felizes com eles. Porque não recordá-los mais vezes?
E os amigos virtuais? Alguns conseguiram ultrapassar a barreira tecnológica e fazer-me sentir realmente estimada.
O calor do amor da minha mãe, da minha irmã, dos meus filhos, dos meus sobrinhos e de tantos mais que não caberiam aqui. Não é amor bastante?
A casa aconchegante, o conforto, o meu sofá, as minhas pantufas, as minhas queridas plantas, a música, os livros, o calor, o meu ninho, o sentido de família levado ao limite, a partilha, a generosidade, a alegria, as conversas e a certeza... ah, essa certeza boa de que deixo aos meus filhos a melhor herança de todas: que saibam apreciar o prazer que se encerra na generosidade, na partilha, na empatia, no cuidado, no carinho!

O grande segredo da vida consiste na ausência de segredo.

Todos sabemos que a vida é um contrato a termo certo, todos sabemos que o tempo de que dispomos é efémero.
Não querendo parecer um guru motivacional (dos quais seria vergonhosa representante), hoje, mais do que nunca, apenas peço mais um dia com a esperança de que possa vir a ser melhor. Cada dia pode ser uma página em branco que podemos preencher ou não. Mais do que nunca, Carpe Diem faz todo o sentido para mim.

E pronto, por hoje não vos incomodo mais. Deixo-vos desejando um enorme Carpe Diem para todos!











segunda-feira, 9 de novembro de 2015

É SÓ UM MARIDO (bem mais fácil do que deixar de fumar)!



Perdoem-me o meu desabafo mas hoje, no meu local favorito para pensar, o comboio, decidi que não teria mais pena de mim nem de qualquer outra mulher que se encontre na mesma situação.

Um marido é só um marido e apenas tem o peso que ele próprio nos vai deixando nas memórias, nos momentos, nos pequenos e grandes gestos, na convivência, na cumplicidade, no auxílio mútuo, na intimidade, na partilha, na lealdade, no respeito, no carinho.

Na ausência de todos, de quase todos ou de alguns dos valores acima descritos, o casamento rapidamente se transforma num não-casamento. Memórias do que não existiu, saudades de quem nunca esteve, amor e dedicação unilaterais, corpo fantasma presente na cama, fotografias incompletas, compromisso mal selado, desencontro de sentimentos.


De repente, uma epifania: medo, é o medo que bloqueia, impede, atrasa, paralisa, engana, alucinante inimigo das boas decisões! 


"Como vou viver sem ele?" - Já vivo!
"O que vão pensar de mim?"- Não importa! 
"Estarei com idade para recomeçar?" - Recomeçar é a única opção! 
"Mereço este casamento?" - Certamente que não!
"Consigo acreditar que vou ser feliz?" - Certamente que sim!
"Vai ser difícil?" - Muito menos do que até agora!
"Três vezes errada?" - Provavelmente mas vivi intensamente!


Difícil, verdadeiramente difícil é deixar de fumar porque o tabaco tem sido um fiel companheiro.
Virá a ser mais fácil abandonar o que nunca se teve, a não ser na imaginação ou no forte desejo de que as coisas, desta vez, corressem bem.
Pensando melhor, como deixar ir quem nunca esteve?
É como deixar de fumar sem nunca ter posto um cigarro na boca... com a vantagem de dispensar acupunctura, pensos transdérmicos ou ímanes mágicos nas orelhas.



Se ainda sonho? Claro que sim. Se acredito no amor? Claro que sim. Se somos mais felizes com uma alma gémea? Talvez.
Assim como talvez não exista outro caminho que não o de sermos a nossa própria alma gémea.
Talvez tenha chegado a hora de me apaixonar por mim, pela primeira vez na vida.
Talvez tenha chegado a hora de me sentar numa bancada muito confortável e ficar a assistir, a apreciar o modo como a vida dos outros continuará, desta vez, sem a minha (in)dispensável presença.



Preciso de um abraço mas já preciso há mais tempo do que devia!
Preciso de me sentir amada, principalmente, por mim!
Preciso de percorrer o meu caminho sozinha, sem ruídos do passado!
Preciso de me encontrar, de me mimar, de me tratar com o respeito que mereço!
Preciso de estar rodeada do amor sincero, verdadeiro e nutritivo de quem nunca me abandonou!
Preciso tanto de acreditar em mim, principalmente agora!
Preciso libertar a fera que se aprisionou em ideias feitas, preconceitos e medo de julgamentos.
Preciso de ter a certeza que o amor não é um investimento seguro, principalmente quando aplicado em operações de alto risco.
Preciso de um abraço... preciso que me digam que sou bonita... preciso de encontrar amor sincero num olhar... preciso de ser prioridade, não conveniência.

Posso até precisar de ter quem saiba amar-me como sou, da mesma forma que preciso de 3 meses de férias na Provença para, finalmente, escrever...
No entanto, aproveito a analogia e deixo bem claro, a quem possa interessar:
Não volto a deixar de sonhar com a Provença para me contentar com 10 dias na Quarteira em Agosto!

Mensagem a reter:
Sentir que nada tenho a perder é o sentimento mais libertador e poderoso de todos... utilizarei este sentimento, vezes sem conta, até que o respeito por mim própria fique definitivamente restabelecido.









segunda-feira, 26 de outubro de 2015

HOMEM A SÉRIO NÃO BATE EM MULHER!



A violência doméstica é inegavelmente um dos maiores flagelos sociais e, ao mesmo tempo, uma das situações com o cariz mais democrático que conheço: é transversal a todas as classes sociais, a todos os estatutos académicos, a todas as idades e a todos os sexos, constituindo as mulheres, os idosos e as crianças o alvo preferencial, provavelmente, por uma questão meramente genética pois são estruturalmente o elo mais fraco da raça humana. 
Hoje, quero falar de e para as mulheres!                                      
Há um sem número de motivos que levam os homens a agredir uma mulher mas aquele que considero mais relevante é o medo, o homem agride porque tem medo. Medo de perder, medo de ser mais fraco, medo de ser inferior, medo de ouvir, medo de não compreender, medo de não controlar. E, qual animal acossado, ataca aquela que vê como sua pertença, mais frágil e mais fácil de dominar. Existem diversos tipos de agressores: os inteligentes, os manipuladores, os chantagistas, os sádicos, os psicopatas, os sociopatas, os obsessivos, os atenciosos, os viscosos e muitos mais...





Por seu turno, as mulheres, não tendo um denominador comum no seu comportamento, estatuto, grau académico ou classe social, pactuam com os agressores com base no amor que sentem ou pensam que sentem, no amor que ele lhes dedica ou pensam que ele lhes dedica, na existência de filhos, na ausência de autonomia financeira, no medo da solidão, no receio da opinião pública e familiar e outros.
Vou evitar referir-me aos indivíduos com patologias psiquiátricas ou alterações comportamentais clinicamente comprovadas para evitar alongar-me em demasia.

Vou falar de mim, de ti, da vizinha, da tia, da amiga, da prima, da conhecida, de todas e de nenhuma em particular. 

É minha convicção de que o nosso primeiro erro acontece quando decidimos não acreditar na luz vermelha que se acende em nós quando temos um pressentimento. O pressentimento surge como um aviso do que vai suceder e nós sabemos, oh, se sabemos que algo está mal: uma frase, um tom de voz, um olhar... mas o amor, o amor continua parcialmente cego, dividido entre o que vê, o que não vê e o que não quer ver. E acabamos por entrar naquela relação certas de que foi uma impressão, que ele estava mal disposto e que, posteriormente, vamos acabar por conseguir mudá-los. Ledo engano que tão cedo se desfaz...

Eu lembro-me, como se fosse hoje, da primeira bofetada que apanhei, não dos meus pais que nunca me bateram mas do meu marido.
Essa lembrança ainda hoje me traz um sorriso ao rosto porque me aviva a memória do dia em que decidi romper com a tortura, sub-reptícia e silenciosa, com que convivia há anos, 18 anos, mais precisamente. Foi a minha manhã de Abril, o meu grito de Ipiranga...

Levantei-me, fui direita à cozinha e preparei o meu pequeno-almoço sem preparar o do meu marido, pecado primeiro. Fui presenteada com mais uma de muitas séries de impropérios, entre os quais, o que eu mais odiava: "puta", "puta", "puta". 
Aquela palavra ecoou na minha cabeça mais vezes do que o costume e eu pensei: "EU NÃO MEREÇO! EU NÃO MEREÇO!". 
Respondi com uma serenidade e uma coragem até então desconhecidas: "Vai chamar puta à grandessíssima puta que te pariu!". 
Não sei se acabei a frase, sei sim, que aconteceu o que eu temia há tanto tempo. Eu sabia que no primeiro dia que ousasse responder-lhe, este seria o resultado (eu sabia!). 

A violência com que a mão de um homem com quase o dobro do meu tamanho me bateu fez com que, por momentos, eu deixasse de ouvir e nem sei descrever o tamanho da dor porque se misturou rapidamente com a vergonha, com o terror e com a coragem inusitada de quem já nada tem a perder, nem a própria vida. 
Consegui libertar-me dele, enquanto me agarrava pelos cabelos, e fugi para a casa de vizinhos com uma caneca de leite na mão que não larguei, vá-se lá saber porquê!
Nos dias, meses que se seguiram não voltei atrás com os meus intentos e todos os dias lhe dizia que não mais queria estar casada com ele. Naturalmente, àquela agressão, seguiram-se outras... a Besta tinha sido libertada com a minha insubordinação.

Sabe bem o que diz quem afirma que um murro dói mas passa, com o tempo a memória da dor desaparece. No entanto, a marca psicológica é mais profunda e enterra-se em nós como um ferrão e nem meses, anos de terapia conseguiram reparar os estragos provocados por frases como: "Sabes lá o que estás a dizer!", "Cala-te e não me envergonhes!", "És mesmo igual à merda da tua família!", "Se não fosse eu a ficar contigo, andavas para aí aos caídos sem ninguém te pegar!", "Quando saíres, vai decente como as mulheres da minha família!"... Todas estas frases e muitas outras poderiam e foram ditas em público para aumentar a humilhação. 

Sob a protecção das telhas de nossa casa e sem que ninguém soubesse, estas frases eram acompanhadas de pedidos de relatórios diários sobre o meu dia, passagem da roupa na frente dele para ver se estava "decente" (nada de decotes, nada de calças justas),tentar chegar a ele para lhe dar um beijo porque ele não se baixava, não falar com homens, evitar certas amigas, evitar a família, meticulosa calendarização da vida íntima com direito a sanções e castigos e demais exigências que eu tentava cumprir por pensar que um casamento era assim e assim fiz silêncio à minha volta.



A única maneira que encontrei para me perdoar a mim própria foi constatar que eu tinha apenas 16 anos quando o conheci. Ele com 22, conseguiu manipular-me, controlar-me de tal maneira que me destruiu antes que eu tivesse tempo de me construir. O resto da minha vida passei-a à procura de mim no meio dos destroços e não tem sido fácil porque a vida real toma conta de nós e temos os filhos, a família, as relações, as ralações, o trabalho e pouco sobra para tratar de nós, menos ainda quando fomos "programadas" para nunca o fazer.

Que fique registado e de forma bem clara que uma mulher vítima de violência doméstica, quer física, quer psicológica, ou ambas, virá a sofrer de danos psicológicos irreversíveis que poderão tomar as mais diversas formas (mas este é outro assunto extenso que não pretendo abordar agora).

Não há segredos, nem conselhos, nem fórmulas que nos ajudem a livrar de um homem assim. Cada caso é um caso e eu penso que é sempre necessário um elemento detonador, no meu caso foram os filhos, o meu instinto de protecção foi maior do que o medo que sentia.

O verdadeiro poder de um homem sem escrúpulos, de um homem que não gosta de ninguém a não ser de si próprio, reside nas palavras, no momento em que as aplica, na linguagem gestual, na violência implícita nos seus actos, deixando no ar a certeza de que se abrirmos a boca para o contrariar, as coisas vão correr muito mal. O seu poder reside na nossa enorme fraqueza, principalmente, quando somos superiores física ou intelectualmente e nos recusamos a demonstrá-lo. O seu poder reside também no nosso silêncio pleno de cumplicidade.

Porque não começares por aqui? Por quebrar o silêncio? Por falares com outras mulheres? Procurar ajuda, manter viva a ideia de que há vida depois destes homens e que ainda podemos ser felizes!

Por favor, fala com alguém, não deixes que o teu nome venha acabar em mais uma notícia de rodapé dos noticiários iguais às que se seguem:
  • "Diz a APAV que "mais de 90% das pessoas ignora os sinais de violência que se passam com vizinhos, amigos ou familiares."



  • " ...a vítima era antiga companheira do arguido, tendo este usado "uma arma de fogo" e disparado à "queima-roupa" nas costas daquela, depois de a esperar nas escadas."

  • “Não conformado com o fim da relação que mantinha com a sua companheira, que terminara por iniciativa desta...  sacou de uma pistola de calibre 6,35 milímetros e atingiu com um tiro a prima da companheira,  matando-a”. A ex-companheira foi depois atingida com 2 tiros tendo ficado com lesões “muito graves que a impedem de comunicar verbalmente e de se movimentar sozinha”.
  • "Mulher assassinada à facada e paulada pelo companheiro".
  • "Mulher encontrada morta com o rosto desfigurado. O assassino era seu companheiro." 
  • "Mulher e bebé de 2 anos queimados, com maçarico de construção civil, pelo marido e pai das crianças."
  • "Em 2014 morreram 42 mulheres. Em média, 4 por mês, 1 por semana. A maioria dos crimes foi cometida com recurso a uma faca. Nestes casos, o agressor demonstra a raiva que sente em relação à sua vítima, bem como a intenção de a fazer sofrer. E essa raiva, essa fúria, esse descontrolo, por parte do agressor, é visível em muitas destas mortes, dado o elevado número de golpes desferidos. São numerosos os casos em que as mulheres são atingidas por sete, oito, nove ou mais facadas, existindo um caso em que a vítima sofreu 17 facadas."  
  • "A arma de fogo foi o segundo meio mais usado. Nos casos restantes, os homicidas escolheram o afogamento, a asfixia, o estrangulamento, o espancamento e o fogo."
  • "Na última década, morreram 398 mulheres em Portugal, vítimas de violência doméstica, cerca de 40 mulheres por ano." 
  • "NADA MUDOU, apesar das alterações legais, da maior especialização e formação de todos os técnicos e instituições envolvidas. As causas são várias predominando o ciúme doentio, os problemas de dependências de álcool e/ou estupefacientes e situações de puro machismo, onde o agressor entende que a companheira é um objecto cujo proprietário é ele e que, em circunstância alguma, tem a possibilidade de por sua vontade sair daquela relação."
  • "Os agressores são principalmente homens, com baixa capacidade de resiliência, baixa capacidade de reacção a situações de frustração, apenas obtendo alívio com a morte da vítima. Este tipo de agressor não teme as consequências penais dos seus actos, afirmando por norma que não és minha não és de mais ninguém.


QUEBRA O CICLO DE VIOLÊNCIA QUEBRANDO O SILÊNCIO!

Eu chamo-me Cristina e fui vítima de violência doméstica. Dou o meu testemunho para vos ajudar...



terça-feira, 13 de outubro de 2015

O PREÇO DO AMOR








"Estou a pensar em ti e ainda não consigo entender o que te levou a fazer-me tal pergunta... Quanto vai custar? Quanto vai custar?

Num ápice, revi todos os momentos que vivemos juntos nos últimos anos e não há soma, subtracção ou equação que resulte num número, num valor exacto.

Como se faz o câmbio do amor para euros?
Não sabes que os sentimentos não têm preço?
Não sabes que não é possível comprar a mulher que fui para ti?
Não sabes o que é amar de verdade, desinteressadamente?

Fecho os olhos e vejo-nos a dançar na rua, na noite. Vejo-me a rir à gargalhada, o que sabias fazer tão bem. Recordo o teu olhar quando fui dormir a tua casa pela primeira vez. Seria capaz de jurar que vi o amor nos teus olhos. A noite atravessada por suspiros, sem dormir... e mais uma noite... e mais uma noite!





E as tardes de verão, um verão de calor infernal em que mergulhávamos no corpo um do outro e já nem sabíamos quem era quem, deixando deslizar os corpos cansados, lado a lado.

Ergueste um pedestal onde me colocaste, prestaste a vassalagem à rainha que era eu no teu coração. Aio dos meus quereres, sempre a postos para me dar prazer, alegria, conforto. Como poderia eu não te amar? Quase ficavas inocente nos meus braços, sorriso de criança, corpo de homem, força de gigante.
Já nos sabíamos tão bem, as palavras eram desnecessárias. Quando eu olhava para ti, os teus olhos já adivinhavam o que me seguia na alma e eu era a mulher mais bonita do universo e eu era a única mulher no universo.

Acreditei, bebi cada palavra tua e julguei meus os teus sentimentos. Deixei de saber onde eu acabava e começavas tu.
Acreditei ser chegada a minha hora, eras tu quem eu tinha procurado toda a vida, era eu quem tu tinhas procurado toda a vida.
Agora sei, descobri da pior forma, que te inventei, criei-te à imagem do meu ideal e, erro meu, esqueci-me que eras só uma pessoa e as pessoas enganam, mentem, traem.
E eu vi mas não queria ver. Com infantilidade, escondi os teus e os meus erros bem lá no fundo, onde guardo tudo o que me dói e eu me recuso a olhar. Inocência tardia, candura deslocada!





Aflita, desesperada, esperei, esperei que tu voltasses do Inferno para onde tinhas partido sem mim, sem saber se virias, se ainda serias o mesmo mas esperei e juro, juro que tinha fé, muita fé que tu ias conseguir sair sozinho.
Os primeiros passos foram tímidos, incertos da direcção a seguir e olhamo-nos como dois estranhos. Procurei incessantemente um sinal de ti mas o teu olhar inocente tinha desaparecido e já não rias.
Deixaste de me olhar, deixaste de me ver e, aos poucos, deixei de existir.
Bomba atómica emocional, arrasaste tudo o que havia à tua volta, até as flores morriam e os pássaros se calavam à tua passagem.
Criaste o caos, trouxeste escuridão e levaste a minha alegria, a minha saúde, o meu coração deixando-o partido em pedaços tão pequeninos que jamais se irão unir para amar.
Há muito se quebrou a aliança que ambos ostentávamos orgulhosamente, certos de que éramos amados como mais ninguém.

Quanto vai custar?

A ti, não sei mas a mim está a custar... muito!





sábado, 10 de outubro de 2015

SOMOS FILHOS DO MESMO DEUS

Não era minha intenção retomar este assunto, até porque, as posições extremadas que tenho visto ultimamente, causam-me um sério desconforto. No entanto, acho que me devo posicionar em relação aos refugiados sírios.
E, a posicionar-me, terei que me solidarizar com todos eles. Antes de me pronunciar, procurei toda a informação disponível sobre o conflito. 
Muito resumidamente, em Março de 2011, houve uma insurreição contra o regime totalitário de Bashar Al-Assad. A partir desse dia, as tropas governamentais tomaram conta das principais cidades e estradas mais importantes do país, utilizando a fome como arma contra os civis. 
Entretanto, as forças opositoras do governo enfrentam, desde 2014, os ataques dos jihadistas islâmicos em busca da supremacia do Estado Islâmico.


Contabilidade feita, os números chegam 
avassaladoramente dramáticos:
- Cerca de 4,5 milhões de deslocados, dentro do país;
- Cerca de 2,4 milhões de pessoas refugiadas em países vizinhos, alvos de racismo e discriminação;
- Cerca de 5,5 milhões de crianças têm as suas vidas devastadas pela guerra;
- Cerca de 1 milhão de pessoas presas em áreas sitiadas onde a ajuda humanitária não consegue chegar;
- Cerca de 1,200 milhões de pessoas vivem refugiadas, morando em locais insalubres, onde a comida e a água potável têm um uso restrito;
- O número de refugiados sírios, no Líbano, na Jordânia, no Iraque, na Turquia e Egipto deverá chegar aos 4,1 milhões de pessoas. Outras 9,3 milhões precisarão de ajuda até ao final de 2015.

Extrapolados ou não, estes números são representativos da violência que está presente no dia a dia destas pessoas. Pessoas, como qualquer um de nós, que acordam um dia no meio de um conflito que não desejam e, cuja necessidade básica a partir dessa data, passa a ser a sobrevivência, sua e dos seus.

Afigura-se-me bastante improvável que, em pleno cenário de guerra, destruição, morte e horror, este povo tenha sangue frio para urdir um plano maléfico com o intuito de  invadir a Europa e "muçulmanizar-nos" de uma vez por todas, nem que seja para cumprir o descrito no maléfico mapa islâmico da Europa (no qual Portugal é um alvo apetecível).

Não consegui deixar de reparar que o ódio tão criticado nas facções radicais do estado islâmico seja o mesmo que senti nas mais diversas publicações e, pior, ante a "invasão dos mouros", ressurge do Inferno, de onde nunca devia ter saído, o nacionalismo. Este sim, é um verdadeiro perigo cujo único propósito é incitar ao ódio entre os povos e às limpezas étnicas.









Como é possível olhar para estas imagens que nos mostram onde a inocência se perde no dia a dia destas crianças e não sentir a urgência de as retirar de tão dantesco cenário? E conseguem imaginar os nossos filhos a matar para não morrer? Sim, os nossos filhos cujo maior drama é não poder comprar o último modelo das sapatilhas da  Nike ou ter que lidar com o mau feitio do professor de Matemática. 

Migrantes? Migrantes? Os migrantes têm opção, escolhem viver noutro país pelas mais variadas razões. Estes são sobreviventes, refugiados, despojados, expatriados, exilados, proscritos da sua pátria. Não escolheram a guerra, não escolheram a destruição, o caos e a morte. Simplesmente, um dia,  as suas vidas deixaram de fazer sentido. Tudo o que conheceram até então, ficou reduzido a escombros. 
É tempo de pegar na família e tentar fugir, ainda que lhes custe a própria vida, fugir do Inferno que tudo lhes roubou. Sem casa, sem roupas, sem documentos, sem dignidade, sem passado, sem presente e sem futuro, sujeitos à ignomínia de quem vive à custa da desgraça alheia, navegam em direcção à Europa, destino que se lhes afigura paradisíaco. 
Para trás ficam a sua amada pátria, as suas raízes, às quais, estou certa, a maioria sonha voltar, viagem de vinda com o coração posto no regresso. 
Como povo católico, piedoso e crente que nos orgulhamos de ser, só nos resta receber estas pessoas condignamente. Deixemos de lado os temores, os ódios, as más vontades, as facções políticas ou religiosas. Façamos jus aos ensinamentos da Santa Madre Igreja, fazer o bem sem olhar a quem, dividir o pouco que temos com quem tem menos ainda.
Acabadas as formalidades, deixemos este povo dormir, usufruir do luxo de fechar os olhos sem medo, há já tanto tempo esquecido. Recebamos estas crianças, tornadas adultas na dor tão precocemente. Vamos dar-lhes o lar possível, colo, comida e, sobretudo, um local seguro onde possam restaurar os seus corpos, a sua dignidade, a sua fé, o seu sossego. Talvez consigam um dia esquecer o monte de escombros que ficou para trás das suas costas. Talvez possam sonhar com o regresso. Talvez possam sonhar com a paz.



https://www.facebook.com/cristina.stuiver/posts/1131283870245709



























sábado, 5 de setembro de 2015

SÃO REFUGIADOS, NÃO MIGRANTES!

Abandonei, por momentos, a minha habitual bonomia e arrastei-me para uma frieza ou entorpecimento emocional, provocado, talvez, pelo uso excessivo de analgésicos que me faz apreciar o que me rodeia com um distanciamento que não me é muito familiar.

Vem isto a propósito da minha falta de comentários às últimas imagens dos refugiados, particularmente, a de um bebé, um inocente, o mais inocente, que jaz abandonado pelos adultos, pelo povo, pela Humanidade, numa qualquer praia transformada num oásis de liberdade, paz e pão para ele e para os seus.

Provocou esta imagem em nós, um natural e justificado repúdio, horror, aflição e, no fundo bem fundo, remorso. Esta imagem tomou a forma de um gigantesco espelho onde vemos reflectida a feiúra da nossa indiferença, do modo desalmado com que seguimos com as nossas vidas todos os dias, todos os meses, todos os anos. Evitamos as imagens dos massacres e de mortes provocadas por guerras sem fim, dos corpos de outras crianças que jazem noutros locais e que duram o tempo que dura uma notícia qualquer.

Que vergonha para todos nós! É necessário a divulgação de uma fotografia digna de um Prémio Pullitzer, para nos lembrar da realidade para além dos nossos quintais, das eleições, da UE, da Merkel, do Passos Coelho, do preço do petróleo.
Que horror passaram estas pessoas antes das fotografias o testemunharem? Não éramos nós sabedores do conflito? O que foi feito ou o que poderia ter sido feito? As nossas calejadas e carregadas consciências já não conseguem atingir este horror, esta indignidade.

Não partilho esta fotografia, não porque vá manchar o mundo simpático do meu mural mas por respeito a esse bebé e a todas as vítimas de violência, seja ela qual for.

No entanto, não posso deixar de tecer alguns comentários porque sou um ser pensante, sensível à terrível (des)humanidade que deixamos crescer em nós. Talvez seja necessário ser desumano para ser humano, por paradoxal que possa parecer. Talvez a crueldade exista para que descubramos a beleza da solidariedade, do amor ao próximo.

Por outro lado, temos o Estado Islâmico, expoente máximo da intolerância, do ódio em nome de Deus ou Alá. Exércitos doutrinados desde o berço com miras apontadas aos infiéis que somos nós. É esta mesma doutrina que provoca a fuga em massa de vítimas da guerra para outros continentes, florescentes e promissores. Animais acossados, fugindo de horrores, mergulhados no limiar morte, da fome, da dignidade num desespero que não conseguimos quantificar.

E é aqui que surge o verdadeiro choque para mim, numa pequena nota de rodapé dando conta que um número indeterminado de cristãos foram atirados ao mar, engrossando o já de si grande número de vítimas do Exército de Alá!
Perdoem-me se não consigo conceber que as mesmas pessoas que apelam à solidariedade, ao respeito pela sua cultura, à tolerância... as pessoas que vêm trazidas em barcos e botes fedendo a morte... as pessoas que conheceram o Mal em toda a sua essência... sejam as mesmas pessoas que atiraram um número indeterminado de cristãos borda fora, em nome de Deus! Que não aceitem comida para os próprios filhos que lhes é oferecida com uma cruz, em nome de Deus!

Perdoem-me se não compreendo que se peça auxílio com a mão direita, em nome de Deus e que se mate com a mão esquerda, em nome do mesmo Deus!
Perdoem-me se temo este ódio tão grande, maior do que o amor aos filhos, maior do que o medo de perder a vida, este ódio maior do que tudo e do qual se alimentam desde que nascem!

Felizmente, nasci no seio de um povo natural e ancestralmente solidário e hospitaleiro, fazemos o bem sem olhar a quem... a quem?
A quem continua a gritar "Morte aos infiéis!"
O verdadeiro Adamastor da humanidade é o ódio, o único capaz de nos transformar em seres execráveis em poucos segundos... o ódio, o pai de todas as guerras, de todas as atrocidades. Sim, pela primeira vez na minha vida temo que a nossa tolerância nos vá sair muito cara!

Fui politicamente incorrecta? Talvez mas também fiz uso daquele que ainda é um direito fundamental que é o direito de expressão!

domingo, 23 de agosto de 2015

SILLY SEASON, SILLY US!

Estamos em plena "silly season" e, a exemplo dos outros anos, o nosso comportamento altera-se com o aumento da temperatura, daí o inglesismo.

Passei este merdoso porque chuvoso domingo a pensar em assuntos pertinentes, tal como um estudo sociológico que levei a cabo durante esta semana.

Utilizei o universo do Facebook e o meu extenso grupo de amigos como cobaias desta interessante experiência.

No dia 17/08/2015, publiquei uma reportagem fantástica do New York Times dando conta da situação inacreditável em Angola, país onde mais crianças morrem por falta de assistência médica ou medicamentosa, deixando médicos e enfermeiros em situação de grave impotência:
1.813 amigos - 2 Gosto, 0 comentários, 0 partilhas.

No dia 04/08/2015, solicitei a partilha de um apelo de uma menina com uma forma de epilepsia grave cujos pais necessitam de ajuda financeira (lembro que 1 euro a cada um de nós, significaria 1,813 euros para a Carolina):
1.813 amigos - 7 Gosto. 1 Comentário. 0 Partilhas.

No dia 21/08/2015, partilhei fotografias minhas, de biquíni, na praia:
1.813 amigos - 105 Gosto. 26 comentários. 0 Partilhas (obrigada pela discrição).

Se eu tivesse feito um pequeno texto para acompanhar as minhas fotografias dizendo que o meu cabelo foi cortado por mim, num momento de enorme frustração e cansaço, farta de entupir o ralo com a minha queda de cabelo, que as dores que tenho transpareçam para os outros, que já não consigo achar-me bonita, que acordo todos os dias sem saber onde estou, nem em que dia, nem em que mês, que os analgésicos me retiram a energia e destreza mental, que a memória recente me falha todos os dias, que nunca sei como vai ser o dia de amanhã, que a minha vida corre à volta de mais ou menos dores, de mais ou menos cansaço. Se eu tivesse dito metade de tudo aquilo que sinto, penso que poucos leriam até ao fim.

Este texto não é uma acusação (antes pelo contrário, agradeço os elogios e, acima de tudo, o modo respeitoso com que mos dirigiram, quer no mural, quer por mensagem privada). Este texto é uma constatação de que todos nós recusamos ver o sofrimento, a doença, a pobreza, a desgraça alheia porque vivemos alheados na nossa própria miséria e esta rede social serve perfeitamente o nosso propósito de aspirar a um mundo perfeito com momentos de ternura, risos e sorrisos em abundância, férias, carros, motas, jantares,famílias felizes e alguns comentários mordazes sobre política, futebol e religião.

Não sou diferente, eu nunca abro vídeos de violência sobre crianças, adultos ou animais. Recuso-me a ver porque o meu estômago não suporta. O sofrimento alheio perturba-me realmente e eu tento que o meu próprio sofrimento, o do meu filho, o meu pesado percurso de vida não apaguem esta vontade que sempre morou em mim de tentar fazer um mundo melhor, através de um sorriso, de uma palavra, de um abraço ou de algumas horas roubadas ao nosso dia a dia em prol dos outros.

Isto é um bocadinho de mim, o resto é só um corpo.

Fiquem bem!



sexta-feira, 15 de maio de 2015

PROIBIDO PROIBIR


Nesta sexta-feira 15 de Maio de 2015, a Assembleia da República discute novos, ponderados e eficazes métodos para fazer com que os portugueses deixem de fumar. Esta agressiva campanha envolve imagens de bebés a fumar, crianças em cemitérios  e outras dentro do mesmo fino recorte fotográfico.
A juntar a esta galeria fotográfica, temos uma frase contundente, quase ditatorial:
"Deixe de fumar, já!" ou "Fumar mata!"



Devo concluir que os autores do estudo ao lado sejam os mesmos que estão a orientar esta importante campanha.
Um fumador não é, necessáriamente, estúpido e está perfeitamente elucidado àcerca dos malefícios do tabaco. Até concordo que não se fume em locais públicos e que o vício de uns não se sobreponha ao bem-estar dos outros. Não concordo que, em plena crise económica, o Estado esteja a consumir recursos para ensinar o que já é sabido. Mais importante seria fazer uma sondagem séria e isenta que nos apresentasse os últimos números relativos às pessoas que vivem em estado de grave carência económica, o porquê da população dos sem-abrigo ter aumentado, quantas crianças e adolescentes vão para a escola com fome, quantos idosos deixaram de comprar a medicação, quantas habitações/vidas foram entregues aos bancos. É que, caso os nossos legisladores se tenham esquecido, fumar mata mas a fome também... chego a pensar que há aqui um certo folclore, fogo de artifício para alienar a opinião pública conferindo um doce e ledo sentimento de que os nossos políticos estão a fazer algo, nem que seja o que já está feito.

Aguardarei com impaciência a chegada de uma brutal e impactante campanha contra o consumo de bebidas alcoólicas com explícitas imagens de mulheres assassinadas pelos maridos alcoolizados, de brutais acidentes de automóveis, provocando mortes de culpados e inocentes, de famílias completamente devastadas e desestruturadas pela existência de um alcoólico nas suas casas, convém que fique bem visível a imagem degradante de um alcoólico depois de urinar e vomitar em cima de si, convém também não esquecer as imagens de fígados cirróticos e do aspecto tão incomodativo que tem um destes doentes.
Estas imagens no rótulo das garrafas de vinho, cerveja, gin ou até em copos de shot, com toda a certeza, demoveria muito boa gente de levar um copo à boca.
 
Como diz a minha irmã, e bem, nunca se ouviu dizer que mais uma mulher foi morta pelo marido que se encontrava sob o efeito do tabaco ou que uma pessoa ia a conduzir com um nível de nicotina maior do que o que a lei permite.
Esperem lá, como ia ficar a exportação do vinho português???

Valha-nos a Santa Hipocrisia, padroeira dos políticos portugueses!

segunda-feira, 20 de abril de 2015

O DIA DO CASAMENTO

Dia do meu Casamento

O dia do casamento é, para a maioria das pessoas, o primeiro passo para o encontro com a felicidade suprema, o santo graal das relações apaixonadas. Quantos de nós entraram nessa instituição com o coração ansioso pelos momentos de paixão que se avizinham? E quantos de nós, aproximadamente dois anos depois, fomos atropelados pelo comboio da rotina?

Tenho uma teoria em relação ao casamento: é que este é constituído, definitivamente, pelos melhores e os piores episódios da nossa vida. E porquê?

Na infância e adolescência, grosso modo, o nosso comportamento e personalidade ainda estão condicionados à nossa família, fazemos o que vimos, aprendemos ou ouvimos. Saídos da zona de conforto que é o nosso lar, inebriamo-nos na liberdade de tudo querer, tudo experimentar, tudo vivenciar.
E é no meio desse turbilhão de emoções que nos aparece, como que por magia, o objecto da nossa paixão. Com esta aparição somos acometidos de uma cegueira súbita que nos impede de observar o ser amado em toda a sua plenitude. Muito pelo contrário, todos os defeitos são por nós diminuídos e justificados.
Entretanto, as hormonas enlouquecem e basta um toque numa mão para nos fazer estremecer, um beijo terá o efeito de um terramoto, um abraço intenso age como uma electrocussão, um passeio ao luar ou um jantar romântico deixam-nos com inspiração para sonhos durante uma semana, a intimidade é complicada, obriga a imaginação a trabalhar, reinventando locais para se concretizar como que se de uma aventura se tratasse. O proibido apimenta deliciosamente os mais inenarráveis episódios.
 

É nesta fase que nos enfeitamos e cuidamos para que o outro tenha sempre uma agradável surpresa a cada encontro. Existe um cuidado permanente que perdura pelo tempo de namoro.

Até que surge o dia principal, o dia em que vamos unir as nossas vidas e, aí sim, já não teremos que passar pela provação da separação diária. Vamos dormir juntos e acordar juntos, é um sonho tornado realidade. 


Subitamente, a realidade cai em cima de nós como um desabamento de terras através de uma das mais naturais funções do ser humano: a flatulência.
No início, dá lugar a enormes ataques de riso. Com o abrir das "hostilidades", o outro também virá a responder da mesma forma e, novamente, com gargalhadas à mistura.
Com o passar do tempo, já não tem tanta graça, quer pelo odor quer pelo excesso de actividade intestinal. Mas o "desabamento de terras" não pára por aqui, a estes episódios seguem-se o corte das unhas dos pés (inicialmente no recato da casa de banho, depois pode ser na sala ou no quarto e, em casos graves, na cozinha); a roupa interior manuseada na lavandaria, é decorada com cores e aromas desagradáveis, os pensos higiénicos e tampões no balde do lixo; os pêlos e cabelos que, alternadamente ou em conjunto, se misturam nos ralos; as idas ao wc, de preferência, com máscara anti-gás; os 150 artigos de maquilhagem absolutamente imprescindíveis que ocupam 90%  do armário; as migalhas que teimam em permanecer perto da torradeira e deixam um rasto até à mesa; os frascos de compota eternamente besuntados e muito mais.



Esta catástrofe a que chamamos rotina tende a piorar depois do nascimento do 1º filho e, para os corajosos, do 2º e 3º. "Ele está a chorar! Vai lá tu porque ontem fui eu!", "Vais sair com os teus amigos e eu fico em casa com os miúdos, como sempre... isto tem que acabar!", "Pensas que tens 15 anos? Alguém tem que ser responsável!", "Como é possível não teres visto o estado dos pneus?", "Mato-me a trabalhar para sustentar esta família e nunca chega!", "O marido da Leonor ajuda em tudo na lida da casa, não sei porque não fazes o mesmo!", "Para termos sexo, vou ter que preencher um formulário?", "Antes de casarmos, eras romântico... agora és um troglodita!", " Vais mesmo sair com essa saia tão curta? Ficas com um ar foleiro!", "Não sei onde tinha a cabeça quando casei contigo!"; "Já não te depilas?" e, a frase mais temida pelos homens "Temos que falar!".

E, perguntam-se nesta altura, como podemos seguir outro caminho ou alterar o existente? Não podemos e daí a elevada taxa de divórcios.
Quando muito, poderíamos viver em casas separadas e marcar encontros com o nosso cônjuge, com direito a perfumes, lingerie ousada e velas. Neste caso, todos ganhariam... o casal, em primeiro lugar, pelas razões mais óbvias, o mercado imobiliário que teria o dobro das solicitações, a indústria da restauração que serviria muito mais jantares, as babysitters que teriam o dobro do trabalho, as crianças que passariam a viver em duas casas com os benefícios inerentes a essa condição e, melhor, seriam poupados às intermináveis discussões dos pais dando lugar a menos processos no Tribunal de Família.


Conclusão:

A efectivar-se a solução descrita, para além de sermos muito mais felizes e de proporcionarmos mais felicidade às nossas famílias, os casais constituiriam uma alavanca para o relançamento económico do País através do incremento das aquisições imobiliárias, através das prestações de serviços, de turismo, restauração e lazer. Seria uma mais valia para a Justiça pois os processos ficariam reduzidos a metade. A Saúde também vai beneficiar porque pessoas felizes são menos doentes. A Educação apresentaria melhores resultados uma vez que as crianças estariam mais equilibradas. Resumindo, a relação benefício/ malefício é claramente positiva, ou seja, namoro eterno é garante de estabilidade social. Tente, se conseguir! E seja feliz! :)

sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015

RESILIÊNCIA OU GADO PARA ABATE?

Como cidadã interessada e informada sobre a adversidade económica que Portugal atravessa, venho partilhar com os meus caros amigos as ideias que invadiram a minha mente depois de ouvir as declarações de Maria Luís Albuquerque, ministra das finanças portuguesa, Wolfgang Schäuble, ministro das finanças alemão e o presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker.

Começarei por citar o presidente da C. E. que "admitiu que a troika pecou contra a dignidade de portugueses, gregos e irlandeses, reiterando que é necessário rever este modelo e não voltar a repetir os mesmos erros". Apelidou ainda de "tratamento indigno" aquele que foi aplicado a estes 3 países da periferia do euro.

Em seguida, sinto-me tentada a referir os rasgados elogios de Schäuber ao nosso país sendo sua opinião que  "Portugal é a melhor prova de que os programas de ajustamento funcionam, quando há tanta discussão sobre a eficácia dos ajustamentos associados à assistência financeira", reiterando que "Portugal, em conjunto com a Irlanda, é  a melhor prova de que os programas funcionam e de forma mais eficaz do que muitos esperariam há quatro anos".

No seguimento das palavras do seu homólogo alemão, Maria Luísa Albuquerque teceu aos seus concidadãos rasgados elogios, cito, "bla, bla, bla, extrordinária resiliência do povo português, bla, bla, bla, extraordinária resiliência do povo português, bla, bla".


Por momentos, senti uma onda de orgulho e fervor lusitano a correr-me nas veias, seria capaz de jurar que elevei a minha mão direita até ao lado esquerdo do meu peito, qual criança que entra no Quadro de Honra da Escola Primária, pensei: "aqui está representada a alma dos nossos intrépidos antepassados, manada de vacas que segue como que anestesiada em direcção ao matadouro!?"





Neste momento, já ressoava em mim a palavra "resiliência", "Resiliência", "RESILIÊNCIA" e, qual revelação do resultado do Euromilhões, saí do meu torpor bovino/ lusitano e analisei os diversos sinónimos da palavra "resiliência" (estoicismo, invulnerabilidade, força, superação, coragem, resistência, recuperação), analisando em seguida, e mais por graça, os seus diversos antónimos (susceptibilidade, vulnerabilidade, fragilidade, fraqueza, comodismo,  conformismo).

Minha cara Maria Luís Albuquerque, não sei em que livros estudou ou até se viveremos no mesmo país porque nunca, repito, NUNCA se tratou de resiliência porque os portugueses que eu reconheço não são estóicos, são conformados; não são invulneráveis, são acomodados; não são fortes, são de brandos costumes; não superam, sujeitam-se; não são corajosos, são comodistas; não resistem, conformam-se e muito, muito dificilmente irão recuperar de um ensaio de modelo de recuperação económica desastroso e indigno, no qual somos meras cobaias, estando irremediavelmente destinados ao fracasso, fado de quem esqueceu a sua identidade, o seu orgulho, o seu sentido de justiça e segue, cabisbaixo, a caminho do suicídio moral colectivo de um país que um dia sonhou Abril.




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